Maranhão

Fraude bilionária no seguro-defeso no MA: INSS paga benefício a milhares de pescadores-fantasma

Um dos principais programas de assistência a trabalhadores da pesca artesanal no Brasil, o seguro-defeso do INSS, está sendo utilizado de forma fraudulenta em diversos municípios, com pagamentos milionários direcionados a pessoas que não exercem a atividade. Investigações apontam que as fraudes são recorrentes em estados como Maranhão e Pará, onde a quantidade de pescadores cadastrados não corresponde à produção pesqueira local. O desvio mensal do seguro-defeso pode chegar a R$ 130 milhões, com a Polícia Federal apurando o envolvimento de federações e colônias de pescadores nos esquemas fraudulentos.

O total de registros no RGP (Registro Geral da Pesca) saltou de 1 milhão em 2022 para 1,7 milhão até maio de 2025 — um acréscimo de 500 mil cadastros em menos de um ano. A escalada foi impulsionada por entidades conveniadas ao INSS, muitas delas já investigadas por fraudes. O Maranhão concentra um terço desses registros, com cerca de 590 mil pescadores inscritos. O estado é seguido pelo Pará, com 347,5 mil.

Apesar do número expressivo de cadastros, a produção de pescados não acompanha esse crescimento. O Maranhão, por exemplo, ocupa apenas a sexta posição na produção nacional, com 50,3 mil toneladas em 2022. O Pará, segundo maior em número de pescadores, produziu ainda menos: 25,1 mil toneladas. Para efeito de comparação, o Paraná, líder nacional, produziu 194,1 mil toneladas.

Além disso, há outros indícios de irregularidade: o Maranhão possui apenas 621 embarcações cadastradas para pesca e não registra nenhuma empresa pesqueira — um contraste gritante com Santa Catarina, que possui 218.

A distorção se repete em municípios como São Sebastião da Boa Vista (PA), Boa Vista do Gurupi (MA), Cedral (MA) e Ponta de Pedras (PA), onde os registros de pescadores superam 30% da população adulta, conforme cruzamento de dados do Ministério da Pesca e do IBGE.

O presidente licenciado da Federação dos Pescadores do Maranhão, deputado estadual Edson Cunha de Araújo (PSB), é alvo de investigação da Polícia Federal por suspeitas de fraude. Entre maio de 2023 e maio de 2024, ele teria movimentado R$ 5,4 milhões da federação, segundo relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

Diante da escalada das fraudes, o governo federal anunciou uma série de mudanças no sistema de concessão do seguro-defeso. Desde janeiro, tornou-se obrigatória a validação biométrica para os novos registros, medida formalizada por decreto em 25 de junho. Além disso, uma medida provisória publicada em 11 de junho determina que as prefeituras deverão homologar os beneficiários.

O Ministério da Pesca informou que está adotando o cruzamento de dados com outras bases governamentais para reforçar os controles.

O Tribunal de Contas da União (TCU) também está conduzindo auditoria para calcular o montante exato dos pagamentos indevidos. As informações, por ora, seguem sob sigilo.

A atuação de intermediários e colônias de pescadores
A investigação da Polícia Federal indica que intermediários e lideranças de colônias de pescadores atuam como facilitadores do esquema. Eles cadastram pessoas que não exercem a pesca, muitas vezes com documentação forjada ou omitindo vínculos com outras atividades remuneradas.

Esses intermediários, segundo os relatos apurados, cobram comissões que variam de 30% a 50% do valor do benefício mensal. Em alguns casos, os próprios beneficiários não têm ciência de que foram incluídos em esquemas fraudulentos, sendo usados apenas como laranjas.

O envolvimento de federações
Federações estaduais de pescadores também estão na mira. Documentos apreendidos pela PF apontam o uso da estrutura sindical para validar cadastros fictícios, emitir declarações de atividade pesqueira falsas e pressionar servidores públicos para a liberação dos benefícios.

O prejuízo aos cofres públicos
De acordo com estimativas feitas por órgãos de controle, o desvio mensal no seguro-defeso pode alcançar até R$ 130 milhões. Em um ano, o montante supera R$ 1,5 bilhão — valor superior ao orçamento de diversos programas sociais legítimos.

Blog John Cutrim

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