‘Arma de guerra’, fome atinge meio milhão de palestinos.

Informes preparados pela ONU revelam que quase 500 mil palestinos em Gaza vivem uma situação de “fome catastrófica”. O principal motivo, segundo a entidade, é o bloqueio realizado por Israel para que a ajuda internacional possa entrar.
De acordo com levantamentos obtidos pelo UOL, entre 19 e 25 de julho, o Programa Mundial de Alimentação da ONU solicitou a entrada de 138 comboios com alimentos em Gaza. Apenas 76 deles foram aprovados.
Mesmo aqueles que podem passar enfrentam obstáculos. Alguns chegam a ter de esperar 46 horas antes de seguir viagem. Nessas horas, verdadeiras multidões se concentram nos locais onde estão os caminhões, gerando tensão e violência.

Uma vez autorizados, cada comboio leva pelo menos doze horas para conseguir fazer as entregas e apenas duas passagens têm sido autorizadas pelo governo de Israel.
Outro obstáculo tem sido a recusa do governo Netanyahu em aprovar um número maior de motoristas de caminhões que possam fazer os trajetos dentro de Gaza. Hoje, apenas 60 homens receberam o sinal verde.
O Programa Mundial de Alimentos indicou que, desde o dia 23 de julho, o governo de Israel tem dado sinais de acelerar a aprovação dos comboios. Mas o ritmo é ainda muito distante do que será necessário para reverter a fome que atinge, segundo a entidade, “níveis surpreendentes”.
A estimativa é de que pelo menos cem caminhões por dia seriam necessários para atender à população de Gaza.

Uma a cada três pessoas sem alimentes por dias
O resultado tem sido uma deterioração acelerada da situação humanitária. “Pessoas estão morrendo devido à falta de assistência humanitária”, alertou o informe. “Quase uma em cada três pessoas não está se alimentando por dias seguidos”, indicou.
O documento revela que 470.000 pessoas estão enfrentando condições semelhantes à “fome catastrófica”, o nível mais agudo numa escala criada pela ONU para avaliar a desnutrição. Segundo a entidade, 90.000 crianças e mulheres precisam” urgentemente de tratamento”.
O governo de Netanyahu rejeita a acusação de que esteja deliberadamente usando a fome contra a população palestina. O argumento das autoridades é de que seria o Hamas que estaria desviando mantimentos e ampliando a crise como forma de criar pressão.
Fome como arma de guerra
Mas juízes internacionais têm outra percepção. Os dados ampliam a pressão internacional sobre Israel, justamente num momento em que a ONU se prepara para uma conferência a partir desta segunda-feira e que tem como objetivo acelerar o reconhecimento da Palestina como um estado soberano.
No Tribunal Penal Internacional, a acusação que pesa contra o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é o de ter implementado um plano para usar a fome como método de guerra.
“Os efeitos do uso da fome como método de guerra, juntamente com outros ataques e punição coletiva contra a população civil de Gaza, são graves, visíveis e amplamente conhecidos, e foram confirmados por várias testemunhas entrevistadas pelo meu Gabinete, inclusive médicos locais e internacionais”, disse Karim Khan, procurador do TPI, no final de 2024.

Elas incluem desnutrição, desidratação, sofrimento profundo e um número crescente de mortes entre a população palestina, incluindo bebês, outras crianças e mulheres.
O que pesa sobre Netanyahu
Fome de civis como método de guerra, como um crime de guerra contrário ao artigo 8 do Estatuto de Roma;
Causar intencionalmente grande sofrimento ou lesões graves ao corpo ou à saúde, contrariamente ao artigo 8, ou tratamento cruel como crime de guerra.
Assassinato intencional ou assassinato como crime de guerra, contrário ao artigo 8;
Dirigir intencionalmente ataques contra uma população civil como um crime de guerra contrário aos artigos 8;
“Por essas razões, com relação aos crimes de guerra, a Câmara da Corte considerou apropriado emitir os mandados de prisão de acordo com a lei de conflitos armados internacionais. A Câmara também considerou que os supostos crimes contra a humanidade faziam parte de um ataque generalizado e sistemático contra a população civil de Gaza”, disse o tribunal.
Haia, assim, considerou que “há motivos razoáveis para acreditar que o indivíduo (Netanyahu) privou intencional e conscientemente a população civil em Gaza de objetos indispensáveis à sua sobrevivência, incluindo alimentos, água, medicamentos e suprimentos médicos, bem como combustível e eletricidade, de pelo menos 8 de outubro de 2024.

“Essa conclusão se baseia no papel do Sr. Netanyahuem impedir a ajuda humanitária, violando o direito internacional humanitário, e em sua incapacidade de facilitar o socorro por todos os meios à sua disposição”, explicam.
“A Câmara constatou que a conduta levou à interrupção da capacidade das organizações humanitárias de fornecer alimentos e outros bens essenciais à população necessitada em Gaza. As restrições mencionadas acima, juntamente com o corte de eletricidade e a redução do fornecimento de combustível, também tiveram um impacto grave na disponibilidade de água em Gaza e na capacidade dos hospitais de fornecer atendimento médico”, afirmou.
“A Câmara, portanto, encontrou motivos razoáveis para acreditar que o Sr. Netanyahu tem responsabilidade criminal pelo crime de guerra de fome como método de guerra”, disse a corte.
De acordo com o tribunal, foi considerado que “há motivos razoáveis para acreditar que a falta de alimentos, água, eletricidade e combustível, além de suprimentos médicos específicos, criou condições de vida calculadas para provocar a destruição de parte da população civil em Gaza, o que resultou na morte de civis, inclusive crianças, devido à desnutrição e à desidratação”.
UOL /ONU