O recado da Toyota, Volkswagen e GM para Lula: se favorecer BYD e carros da China, milhares de brasileiros podem ser demitidos

Montadoras alertam para risco de demissões em massa no Brasil diante de incentivos a veículos chineses, enquanto governo analisa mudanças na política industrial do setor automotivo.
Os principais executivos da Toyota, Volkswagen, General Motors e Stellantis enviaram uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva alertando sobre o impacto que uma possível medida do governo pode provocar no setor automotivo nacional.
A preocupação do grupo está relacionada à intenção da administração federal de criar incentivos para veículos montados com peças e componentes fabricados integralmente fora do Brasil, proposta que tramita sob a coordenação do ministro da Casa Civil, Rui Costa.
Segundo o documento, caso a medida avance, a maior beneficiada será a indústria automobilística chinesa, especialmente empresas como a BYD, que adota o modelo SKD (Semi Knocked Down), no qual carros chegam parcialmente montados e são finalizados no país de destino.
Ainda conforme o documento, nesse sistema, há pouca contratação de fornecedores locais e, consequentemente, baixa geração de empregos no Brasil.

Investimentos das montadoras no Brasil
O grupo das quatro montadoras, que responde por significativa parcela da produção nacional de veículos, destaca na carta que os investimentos anunciados para os próximos cinco anos somam cerca de R$ 180 bilhões, dos quais R$ 130 bilhões são direcionados ao desenvolvimento e produção de veículos, e outros R$ 50 bilhões ao setor de autopeças.
Com a possibilidade de entrada facilitada de carros produzidos no exterior, as empresas projetam um corte mínimo de R$ 60 bilhões nesses investimentos, além de uma drástica redução no número de vagas de trabalho.
As montadoras calculam que, além da suspensão da contratação de aproximadamente 10 mil novos trabalhadores, ao menos 5 mil empregos existentes podem ser eliminados.
Os executivos também enfatizam o efeito multiplicador desse impacto: para cada posto de trabalho perdido nas fábricas, outros dez podem ser extintos em toda a cadeia produtiva de autopeças e sistemistas, potencializando o corte para até 50 mil vagas em todo o segmento automotivo brasileiro.
No texto, as empresas afirmam: “Essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra”, alertando para o risco de desestruturação da cadeia produtiva nacional caso se priorize o modelo de importação de veículos parcialmente desmontados.
O comunicado dos presidentes das montadoras pede que a política industrial privilegie a fabricação local, propondo que sejam vetados incentivos à importação de veículos desmontados ou montados no exterior com subsídios.
As empresas argumentam que, sem medidas de proteção à indústria nacional, o mercado interno poderá sofrer perdas estruturais, com consequências econômicas e sociais para diferentes regiões do Brasil.
A carta também foi direcionada a Rui Costa, chefe da Casa Civil, e ao vice-presidente Geraldo Alckmin, que ocupa o cargo de ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
Rui Costa, político com forte atuação na Bahia, estado que atualmente recebe um dos maiores investimentos da BYD no país, tem papel central na discussão das novas regras.
Incentivos para veículos chineses e decisões do governo
De acordo com informações divulgadas recentemente pelo jornal O Estado de S. Paulo, o Gecex-Camex (Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior), colegiado composto por representantes de 11 ministérios, vai se reunir extraordinariamente nesta quarta-feira (30) para deliberar sobre os pedidos de redução tarifária feitos pela BYD.
Em fevereiro deste ano, a BYD solicitou ao governo federal a diminuição das alíquotas de importação de kits SKD e CKD (Completely Knocked Down), usadas na produção de carros elétricos e híbridos.
Atualmente, a taxa para veículos elétricos está em 18% e, para híbridos, em 20%.
A empresa pleiteia a redução para 5% e 10%, respectivamente, alegando que a mudança seria fundamental para estimular o segmento de carros eletrificados no Brasil.
Riscos e desafios para empregos e fornecedores brasileiros
O cenário, segundo as montadoras tradicionais, é preocupante.
Nesse sentido, elas afirmam que a adoção de incentivos à importação pode comprometer não apenas os investimentos previstos, mas também o desenvolvimento tecnológico e a geração de empregos qualificados.
O receio das empresas é de que a entrada massiva de veículos chineses, especialmente por meio de regimes como o SKD, coloque em risco a competitividade da indústria nacional e leve à retração do parque de fornecedores brasileiros.
Os executivos reiteram que a competitividade da indústria automotiva no Brasil depende de políticas públicas que fortaleçam a produção local, incentivem a pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias, e garantam estabilidade para investidores.
Segundo dados do setor, cada emprego direto nas fábricas corresponde a pelo menos dez indiretos, ilustrando o potencial de impacto de uma retração no segmento.
Expectativa por respostas e impactos futuros
Até o momento, o presidente Lula não se manifestou publicamente sobre a carta enviada pelas montadoras.
Conforme especialistas, o silêncio preocupa representantes do setor, que temem decisões unilaterais capazes de alterar significativamente o ambiente de negócios e o futuro do emprego na indústria automotiva brasileira.
Da mesma forma, não houve resposta formal por parte do vice-presidente Geraldo Alckmin ou do ministro Rui Costa.
A decisão sobre a redução de impostos e as novas regras para importação de veículos desmontados está prevista para ser discutida ainda no mês de julho, e o resultado é aguardado com expectativa por todo o setor.
Você acredita que incentivar a entrada dos carros da China pode realmente ameaçar o emprego de milhares de brasileiros ou é uma oportunidade para modernizar a indústria automotiva do país?
Confira a carta na íntegra:
Excelentíssimo Senhor Presidente Lula,
Com nossos cumprimentos, vimos expor o teor de nossas preocupações quanto ao futuro da indústria automotiva brasileira. O setor tem sido, desde os anos 1950, um importante vetor de industrialização e de crescimento econômico para o Brasil. Nasceu de uma visão desenvolvimentista, impulsionando com sua expansão um dos maiores e mais diversificados parques mundiais de fabricantes de veículos e autopeças.
A cadeia produtiva automotiva exibe números consistentes, que atestam o acerto da estratégia de localização da produção de veículos e seus componentes. São 26 fabricantes de veículos instalados no país e 508 produtores de autopeças, que formam uma cadeia produtiva responsável por 2,5% do PIB brasileiro, 20% do PIB industrial de transformação, pela geração de 1,3 milhão de empregos e por um faturamento anual de US$ 74,7 bilhões.
Nossa indústria planeja investir R$ 180 bilhões nos próximos anos, sendo R$ 130 bilhões no desenvolvimento e produção de veículos e outros R$ 50 bilhões no parque de autopeças.
Essa sólida cadeia industrial consolidou-se ao longo de mais de 70 anos de presença no Brasil. Sucessivas ondas de investimentos no decorrer desse período histórico enraizaram profundamente a capacidade industrial, tecnológica e de desenvolvimento de produtos e engenharia de nosso setor, impactando positivamente a economia e a sociedade. A industrialização urbanizou o país, expandiu o mercado de trabalho, impulsionou a educação e a ciência, somou desenvolvimento econômico ao social. Além de resultar em uma base industrial como poucas no mundo, propiciou a consolidação da engenharia nacional.
É nosso dever alertar, Senhor Presidente, que esse ciclo, virtuoso de fortalecimento da indústria nacional está sendo colocado em risco e sofrerá forte abalo se for aprovado o incentivo à importação de veículos desmontados para serem acabados no país.
Ao contrário do que querem fazer crer, a importação de conjuntos de partes e peças não será uma etapa de transição para um novo modelo de industrialização, mas representará um padrão operacional que tenderá a se consolidar e prevalecer. reduzindo a abrangência do processo produtivo nacional e, consequentemente, o valor agregado e o nível’e geração de empregos.
Por uma questão de isonomia e busca de competitividade, essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra. Seria uma forte involução, que em nada contribuiria para o nível tecnológico de nossa indústria, para a inovação ou para a engenharia nacional. Representaria, na verdade, um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica.
Trazemos nossos argumentos à sua análise, Senhor Presidente, na expectativa de que seu governo assegure igualdade de condições na competição pelo mercado, vetando privilégios para a importação de veículos desmontados ou produzidos no exterior com subsídios. Confiamos na sensibilidade de Vossa Excelência para preservar a isonomia concorrencial e proteger a indústria que produz no Brasil.
Nossos investimentos em curso resultarão em novas plantas industriais, em mais empregos, valor agregado e em uma nova geração de veículos cada vez mais sustentáveis. Reafirmamos, desse modo concreto, nosso compromisso com o fortalecimento da indústria nacional e com o desenvolvimento econômico e social do Brasil.
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